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sexta-feira, 13 de maio de 2011
terça-feira, 10 de maio de 2011
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Devaneio
CAPÍTULO XXIX - O IMPERADOR
(Dom Casmurro, Machado de Assis)
Em caminho, encontramos o Imperador, que vinha da Escola de Medicina. O ônibus em que íamos parou, como todos os veículos; os passageiros desceram à rua e tiraram o chapéu, até que o coche imperial passasse. Quando tornei ao meu lugar, trazia uma idéia fantástica, a idéia de ir ter com o Imperador, contar-lhe tudo e pedir-lhe a intervenção. Não confiaria esta idéia a Capitu. "Sua Majestade pedindo, mamãe cede", pensei comigo.
Vi então o Imperador escutando-me, refletindo e acabando por dizer que sim, que iria falar a minha mãe; eu beijava-lhe a mão, com lágrimas. E logo me achei em casa, à esperar, até que ouvi os batedores e o piquete de cavalaria; é o Imperador! é o Imperador! toda a gente chegava às janelas para vê-lo passar, mas não passava, o coche parava à nossa porta, o Imperador apeava-se e entrava. Grande alvoroço na vizinhança: "O Imperador entrou em casa de D. Glória! Que será? Que não será?" A nossa família saía a recebê-lo; minha mãe era a primeira que lhe beijava a mão. Então o Imperador, todo risonho, sem entrar na sala ou entrando, — não me lembra bem, os sonhos são muita vez confusos, — pedia a minha mãe que me não fizesse padre, — e ela, lisonjeada e obediente, prometia que não.
— A Medicina, — por que lhe não manda ensinar Medicina?
— Uma vez que é do agrado de Vossa Majestade...
— Mande ensinar-lhe Medicina; é uma bonita carreira, e nós temos aqui bons professores. Nunca foi à nossa Escola? É uma bela Escola. Já temos médicos de primeira ordem, que podem ombrear com os melhores de outras terras. A Medicina é uma grande ciência; basta só isto de dar a saúde aos outros, conhecer as moléstias, combatê-las, vencê-las... A senhora mesma há de ter visto milagres. Seu marido morreu, mas a doença era fatal, e ele não tinha cuidado em si... É uma bonita carreira; mande-o para a nossa Escola. Faça isso por mim, sim? Você quer, Bentinho?
— Mamãe querendo...
— Quero, meu filho. Sua Majestade manda.
Então o Imperador dava outra vez a mão a beijar, e saía, acompanhado de todos nós, a rua cheia de gente, as janelas atopetadas, um silêncio de assombro; o Imperador entrava no coche, inclinava-se e fazia um gesto de adeus, dizendo ainda: "A Medicina, a nossa Escola." E o coche partia entre invejas e agradecimentos.
Tudo isso vi e ouvi. Não, a imaginação de Ariosto não é mais fértil que a das crianças e dos namorados, nem a visão do impossível precisa mais que de um recanto de ônibus. Consolei-me por instantes, digamos minutos, até destruir-se o plano e voltar-me para as caras sem sonhos dos meus companheiros.
Por mais improvável que fosse a realização da "idéia fantástica" de Bentinho, ainda era ele mais afortunado que eu, uma vez que sua mãe observaria qualquer intervenção do Imperador. Já meu pai não ouviria nem Imperador, nem ninguém, porque não admite nenhuma autoridade.
Contudo - e apesar de não ser criança ou namorado - imagino Mészáros em minha intercessão:
- A Chaui, - por que não a lê? O que é Ideologia já é um esclarecimento. Em seguida, poderia apanhar a Introdução do meu Filosofia, Ideologia e Ciência Social. É leitura para quem já deu seus "primeiros passos" (e outros tantos mais - cumpre-me reconhecer), e que exigirá disposição e atenção para além daquelas costumeiras, com as quais o senhor acompanha os telejornais e revistas. Todavia, provará justamente como não convém se bastar com noticiários. Importa é emendar um passo no outro e não parar de caminhar. Faça isso por si mesmo, sim?
Então Mészáros autografaria meu Para além do capital e partiria, sob a suspeita de meu pai, porém com toda minha gratidão.
Essa minha visão espero que não seja assim do impossível, porque me mortifica ver a do meu pai entre as "caras sem sonhos".
(Dom Casmurro, Machado de Assis)
Em caminho, encontramos o Imperador, que vinha da Escola de Medicina. O ônibus em que íamos parou, como todos os veículos; os passageiros desceram à rua e tiraram o chapéu, até que o coche imperial passasse. Quando tornei ao meu lugar, trazia uma idéia fantástica, a idéia de ir ter com o Imperador, contar-lhe tudo e pedir-lhe a intervenção. Não confiaria esta idéia a Capitu. "Sua Majestade pedindo, mamãe cede", pensei comigo.
Vi então o Imperador escutando-me, refletindo e acabando por dizer que sim, que iria falar a minha mãe; eu beijava-lhe a mão, com lágrimas. E logo me achei em casa, à esperar, até que ouvi os batedores e o piquete de cavalaria; é o Imperador! é o Imperador! toda a gente chegava às janelas para vê-lo passar, mas não passava, o coche parava à nossa porta, o Imperador apeava-se e entrava. Grande alvoroço na vizinhança: "O Imperador entrou em casa de D. Glória! Que será? Que não será?" A nossa família saía a recebê-lo; minha mãe era a primeira que lhe beijava a mão. Então o Imperador, todo risonho, sem entrar na sala ou entrando, — não me lembra bem, os sonhos são muita vez confusos, — pedia a minha mãe que me não fizesse padre, — e ela, lisonjeada e obediente, prometia que não.
— A Medicina, — por que lhe não manda ensinar Medicina?
— Uma vez que é do agrado de Vossa Majestade...
— Mande ensinar-lhe Medicina; é uma bonita carreira, e nós temos aqui bons professores. Nunca foi à nossa Escola? É uma bela Escola. Já temos médicos de primeira ordem, que podem ombrear com os melhores de outras terras. A Medicina é uma grande ciência; basta só isto de dar a saúde aos outros, conhecer as moléstias, combatê-las, vencê-las... A senhora mesma há de ter visto milagres. Seu marido morreu, mas a doença era fatal, e ele não tinha cuidado em si... É uma bonita carreira; mande-o para a nossa Escola. Faça isso por mim, sim? Você quer, Bentinho?
— Mamãe querendo...
— Quero, meu filho. Sua Majestade manda.
Então o Imperador dava outra vez a mão a beijar, e saía, acompanhado de todos nós, a rua cheia de gente, as janelas atopetadas, um silêncio de assombro; o Imperador entrava no coche, inclinava-se e fazia um gesto de adeus, dizendo ainda: "A Medicina, a nossa Escola." E o coche partia entre invejas e agradecimentos.
Tudo isso vi e ouvi. Não, a imaginação de Ariosto não é mais fértil que a das crianças e dos namorados, nem a visão do impossível precisa mais que de um recanto de ônibus. Consolei-me por instantes, digamos minutos, até destruir-se o plano e voltar-me para as caras sem sonhos dos meus companheiros.
Por mais improvável que fosse a realização da "idéia fantástica" de Bentinho, ainda era ele mais afortunado que eu, uma vez que sua mãe observaria qualquer intervenção do Imperador. Já meu pai não ouviria nem Imperador, nem ninguém, porque não admite nenhuma autoridade.
Contudo - e apesar de não ser criança ou namorado - imagino Mészáros em minha intercessão:
- A Chaui, - por que não a lê? O que é Ideologia já é um esclarecimento. Em seguida, poderia apanhar a Introdução do meu Filosofia, Ideologia e Ciência Social. É leitura para quem já deu seus "primeiros passos" (e outros tantos mais - cumpre-me reconhecer), e que exigirá disposição e atenção para além daquelas costumeiras, com as quais o senhor acompanha os telejornais e revistas. Todavia, provará justamente como não convém se bastar com noticiários. Importa é emendar um passo no outro e não parar de caminhar. Faça isso por si mesmo, sim?
Então Mészáros autografaria meu Para além do capital e partiria, sob a suspeita de meu pai, porém com toda minha gratidão.
Essa minha visão espero que não seja assim do impossível, porque me mortifica ver a do meu pai entre as "caras sem sonhos".
sábado, 21 de fevereiro de 2009
Sei Dançar
"Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria."
(Manuel Bandeira)
Tampouco tomo éter ou cocaína. Se também já tomei tristeza, também hoje tomo alegria!
Bebo da alegria que desejo lhe trazer. Daquela com que posso lhe cobrir!
Recusá-la seria simplesmente uma penna.
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria."
(Manuel Bandeira)
Tampouco tomo éter ou cocaína. Se também já tomei tristeza, também hoje tomo alegria!
Bebo da alegria que desejo lhe trazer. Daquela com que posso lhe cobrir!
Recusá-la seria simplesmente uma penna.
sexta-feira, 30 de janeiro de 2009
Desatino
Numa noite qualquer, os mortos se levantam de suas covas, leem os epitáfios que se lhes dedicaram, riscam-nos, alteram-nos, desmentem-nos. Assim o cenário de "A Morta", conto de Maupassant.
As inscrições tumulares lembravam "bons pais", "filhos devotados", "comerciantes probos": perfis tão falsos que refutados até por aqueles a quem se referiam. As emendas, por sua vez, revelaram "vingativos, desonestos, hipócritas": verdades "que todo mundo ignora ou finge ignorar nesta Terra" e de cuja confissão não provém nenhuma redenção, simplesmente porque póstuma.
São uns Brás Cubas, aqueles defuntos, livres que estão das consequências de seus atos. Suas revelações, caprichos - ou alívios de consciência, se muito. Porém, provocadoras.
Fizeram-me pensar na correção que eu faria ao meu epitáfio, caso houvera sido enterrado naquela "cidade dos desaparecidos" e logo após minha provável surpresa com o que disseram de mim.
Até agora, então, - e sem demora nem prudência - algo como:
São uns Brás Cubas, aqueles defuntos, livres que estão das consequências de seus atos. Suas revelações, caprichos - ou alívios de consciência, se muito. Porém, provocadoras.
Fizeram-me pensar na correção que eu faria ao meu epitáfio, caso houvera sido enterrado naquela "cidade dos desaparecidos" e logo após minha provável surpresa com o que disseram de mim.
Até agora, então, - e sem demora nem prudência - algo como:
"Maltratou irmão e mãe, muitas vezes calou-se e, tantas outras, preferiu livros a pessoas."
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
Certa incerteza
Elaboro cá rol de planos comigo mesmo, ocupações para as férias recém-chegadas. Quero escrever, mas não me acorre quê.
Vasculhando a memória, atrás de assunto que mereça roubar tempo meu à leitura, encontro, afinal, um digno e desafiador!
Prontamente, valores cristãos em mim subsistentes evocam duras penas para este meu ser que há muito os quer abandonados; fincam duras estacas em volta de meu tema, ao redor das quais estiram arames invisíveis; cercam duras verdes íris dos mais belos olhos deste mundo.
Restolhos de cristianismo! Contudo, não me impedem de prosseguir. Atrasa-me, isto sim, alguma indecisão quanto às minhas intenções com esta postagem. Render uma singela homenagem? Tão-somente brincar com o som das palavras? Tentar?
Desconheço meus propósitos. Castro este texto!
Vasculhando a memória, atrás de assunto que mereça roubar tempo meu à leitura, encontro, afinal, um digno e desafiador!
Prontamente, valores cristãos em mim subsistentes evocam duras penas para este meu ser que há muito os quer abandonados; fincam duras estacas em volta de meu tema, ao redor das quais estiram arames invisíveis; cercam duras verdes íris dos mais belos olhos deste mundo.
Restolhos de cristianismo! Contudo, não me impedem de prosseguir. Atrasa-me, isto sim, alguma indecisão quanto às minhas intenções com esta postagem. Render uma singela homenagem? Tão-somente brincar com o som das palavras? Tentar?
Desconheço meus propósitos. Castro este texto!
terça-feira, 11 de novembro de 2008
De nova para cheia
Flagrar sua amada Angélica enlaçada por Medoro e os perder, porque feitos de matéria tão "tênue e fugaz" que inapreensível às "manoplas de ferro" suas, roubou a inteligência de Rolando: "algo dentro dele se rompeu, explodiu, acendeu e fundiu-se, e instantaneamente apagou-se-lhe o lume do intelecto e ele mergulhou na escuridão". Assim Ítalo Calvino entrega seu herói à loucura, numa das surpreendentes histórias de O castelo dos destinos cruzados.
Logo na seguinte, Astolfo, incumbido de resgatar o juízo de Rolando, recorre a um adivinho que lhe indica os "campos lívidos da Lua", onde se localizariam "as histórias que os homens não viveram" e "as partículas do possível descartadas no jogo das combinações". Engana-se o adivinho.
A Lua guarda menos histórias não vividas que à espera de quem lhes dê vida. Em vez de possibilidades descartadas, apenas umas ainda desconsideradas.
Dela partem "todos os discursos e poemas" dos quais é merecedora. Nela se encontra o "rimário universal das palavras e das coisas", a partir do qual o poeta interpola "as razões e as desrazões".
A Lua é razão da escrita e desrazão acometedora de cada um a que se apresenta.
Logo na seguinte, Astolfo, incumbido de resgatar o juízo de Rolando, recorre a um adivinho que lhe indica os "campos lívidos da Lua", onde se localizariam "as histórias que os homens não viveram" e "as partículas do possível descartadas no jogo das combinações". Engana-se o adivinho.
A Lua guarda menos histórias não vividas que à espera de quem lhes dê vida. Em vez de possibilidades descartadas, apenas umas ainda desconsideradas.
Dela partem "todos os discursos e poemas" dos quais é merecedora. Nela se encontra o "rimário universal das palavras e das coisas", a partir do qual o poeta interpola "as razões e as desrazões".
A Lua é razão da escrita e desrazão acometedora de cada um a que se apresenta.
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