quinta-feira, 26 de junho de 2008

momento perfeito

Em Virgínia, num domingo de Páscoa, houve uma vez em que eu, pouco antes de partir de volta a São Paulo, e acompanhado de duas das mais queridas amigas que tenho, fui a uma padaria e comprei um dos melhores lanches que já comi. Nós três nos sentamos na fachada de uma loja, em frente às crianças que curtiam seus últimos momentos na cama elástica, instalada somente nos dias de festas, e conversamos a respeito de não sei mais que coisas. O céu estava com a coloração amarelada dos finais de tarde, de que tanto gosto. Num estalo, dei-me conta de que me encontrava plenamente feliz.
Aquela certamente foi uma das "situações privilegiadas" a que Anny, em A Náusea, de Sartre, costumava se referir. Situações de uma "qualidade totalmente rara e preciosa", em que os nela envolvidos estivessem arrebatados por algum sentimento. Em meu caso, uma profunda calma interior. Contudo, eu não soube fazer dela um "momento perfeito". A verdade é que nem podia, não havia lido o livro até então.
Anny falava que transformar situações privilegiadas em momentos perfeitos era uma questão de se perceber mergulhado numa situação excepcional e de sentir que se pode dominar a situação toda. Ações deveriam ser feitas, atitudes tomadas e palavras ditas, e outras palavras e atitudes deveriam ser evitadas.
Para esclarecer o momento perfeito a um atarantado Roquentin, Anny recorda o primeiro beijo que se deram. Ela se sentara sobre urtigas, que a feriam aos menores movimentos, e que ela relevou bravamente. O beijo que estava decidida a dar a Roquentin era de uma importância muito maior que a excitação, maior que um "desejo especial de seus lábios", pois que este ela sequer sentia. Era "um engajamento, um pacto".
Nunca me sentei sobre urtigas. No entanto, já me sentei, muito desconfortavelmente, numa cadeira normal, de maneira a abrigar em meus braços, da maneira mais aconchegante que pudesse, a menina pela qual alimento um imenso carinho. E nos beijávamos, ainda melhor que pela primeira vez e dos melhores beijos de todas as vezes.
Eu já tive um momento perfeito.

2 comentários:

Tutank Akenaton disse...

Cara, eu não acredito em momentos perfeitos. Não dá. Simplesmente não entra na minha cabeça; eu sempre consigo achar alguma porcaria pra ferrar com tudo.

Bernardo disse...

talvez o que vc entenda por momento perfeito não seja o mesmo que Anny entendia, =)
experimente aninhar em seus braços uma menina que te encante e verá que, ainda que seu corpo clame por uma posição mais confortável, vc sequer pensa em atendê-lo.